Era mais uma noite como todas as outras. Saio de
casa, olho e vejo o céu, incomum – tinha algo estranho pairando no ar, como se
algo estivesse prestes a acontecer. Tranco o portão e sigo em frente –
apenas queria sair
dali, seja por alguns minutos ou por que não horas? Segui sem destino pelas
ruas e vielas, apreciando o vento no rosto, ouvindo o barulho das árvores pelo
caminho, as ruas mal iluminadas, apreciando o momento, o agora – meu presente.
Ao me perder por alguma dessas ruas, sinto algo no rosto, paro e olho para cima
e percebo as pequenas gotas de chuva vindo ao meu encontro, como se fosse
exatamente o que eu precisava. Aproveito, por alguns instantes, aquele momento
singular par mim, mas em poucos segundos, as gotas se transformam em uma forte
pancada de chuva. Começo a correr, mas com um sorriso no rosto, apostando com a
chuva, o quanto ela conseguia me encharcar – parecia bobo, mas era o tipo de
aposta que me conectava com aquela criança interna. Ao correr, o mais rápido
que podia, avisto, ao que me parecia, um bar com um letreiro escrito “Lua” – tentei
me recordar se já havia, em algum momento, ouvido falar desse lugar e nada vem à
mente. Penso em usar o lugar como refúgio, ao menos até a chuva passar. Ao
entrar por uma porta toda trabalhada, me deparo com algumas mesas, com pequenos
candelabros e cadeiras com detalhes vitorianas. Em um dos cantos havia duas
mesas de sinuca e ao lado, uma jukebox. Atrás de uma bancada estava um barman
que, ao me ver, abre um largo sorriso e acena para me sentar sobre um dos
bancos da bancada, em frente a ele. Acabo não pensando muito e vou. Antes de me
sentar, ele fala:
— Noite estranha, não é? Essa chuva foi inesperada.
Sente-se, fique à vontade.
Ao me sentar, não vejo o cardápio pelo balcão e quando
me dirijo para perguntar, ele continua a falar, não deixando de sorrir:
— Serei seu guia pelo “Lua” hoje. Deixe-me preparar
algo para beber, eu sei exatamente o que você precisa! Confie em mim! Quando
digo isso, é porque conheço o que as pessoas precisam.
Me pareceu estranho de imediato e, quando me dou
conta, vejo ele se pôr a fazer uma mistura em copo, com nomes que nunca havia
visto na vida – Sempre fui o tipo de pessoa que gosta de experimentar, mas a
forma como me falou, fazendo aquela mistura sem ao menos questionar os meus
gostos, nada. Estranhamente me senti confortável com isso, senti que apenas
deveria apreciar aquele momento, sem questionamento algum – confiei no meu
instinto!
Ao pôr o copo em minha frente, com uma quantidade
razoável do drink, ele se pôs a falar novamente, com aquele tenro sorriso no
rosto:
— O “Lua” é um bar diferente. Fique em paz, aqui no
“Lua” queremos apenas mostrar algumas perspectivas diferentes. Somos bons
ouvintes, por isso saiba que sabemos de tudo! Espero que aproveite o seu drink.
Ao olhar o copo, não penso duas vezes e tomo um
gole. O gosto é bem agradável, tem um leve amargor e um toque de doçura, que se
misturam e tornam um sabor único – nunca havia tomado nada nem próximo daquele
sabor. Quando coloco o copo na bancada, ele continua a falar:
— Como te disse sabemos de tudo aqui no “Lua”,
temos uma particularidade, não conhecemos as pessoas pelas palavras ditas, mas
sim pelos seus corações. Não temos um “cardápio” fixo, afinal, cada pessoa aqui
precisa de algo em especial. Quando te vi entrar, percebi o que você precisava:
apenas percepção. Seu drink é único. Tudo o que precisa no agora! Essa mistura
de amargor e doçura é a combinação perfeita para o que vou te falar e leve para
sempre consigo: A cada pequeno gole desse drink lembre-se que a vida é como ele,
tem seus toques de amargura, mas tem os toques de doçura. Todos passamos por
isso diariamente, em cada passo que damos em nossa jornada. Nem sempre será doce,
mas também nem sempre será amarga. O importante é você ter a percepção de até
nos toques amargos enxergar a doçura, e o inverso também se aplicada a regra,
mas independente disso, você escolhe qual lado quer carregar pra si!
Ao terminar essa frase, sinto lágrimas escorrerem
pelo meu rosto, sem filtro, sem pensamentos, apenas saem. E não consigo soltar
uma palavra, quando ele continua a dizer:
— Projete nesse drink, sua vida e seus problemas,
tenha certeza que a cada gole, ele virá como uma pequena percepção e luz, luz
para seus problemas e suas batalhas, além de te relembrar os bons momentos da
vida. Aproveite o agora! A cada pequeno gole terá a clareza da água, a
paciência de um monge, a força de mil homens, a bondade de um santo, o
discernimento necessário para si mesmo! Estarei por aqui, e saiba que nunca
estará sozinho! A propósito, esse é por minha conta! – aquele sorriso que nunca
saiu da minha mente.
Fico completamente atônito, com o rosto encharcado
por lágrimas, me pus a apreciar aquela bebida, em meu silêncio, apenas atento a
ela e ao barman, que se pôs à fazer suas tarefas, a limpar os copos – sempre
com aquele sorriso que nunca mais saiu da minha mente.
Ao acabar o drink, me senti revigorado, como se
fosse uma pequena poção mágica. Deixo o copo em minha frente e agradeço apenas
com um aceno – me faltavam palavras para agradecer por aquilo. Quando ele me
chama ao fundo e diz:
— Não agradeça a mim, mas sim, a si! Todos estamos sempre
fazendo o melhor, saiba que esse drink não tinha nada alcoólico. Nunca saberá a
sua fórmula, mas posso te dizer que ele tem algo muito especial, a sua força, a
sua essência, seu mérito. Sempre que precisar o “Lua” estará disponível para ti.
Lembre-se: você nunca estará sozinho na sua jornada!
Ao sair vejo que a chuva parou, fecho os olhos e ao
abrir me vejo em casa. Me pergunto se aquilo foi um sonho, um devaneio ou se
aquilo realmente aconteceu? Independentemente de qualquer coisa, decido que o
hoje será diferente do ontem, fazendo um amanhã muito melhor!